QUAL É MESMO O SEU NOME?
(Pelo direito ao uso do nome social)
Rita Mendonça*
Dia 28 de junho é o Dia Internacional contra a Homofobia.
Um diferencial neste ano de 2016 em nosso país, que ocorreu em razão desta data, foram os vários órgãos e entidades que durante o mês regulamentaram em seus estabelecimentos o uso do nome social por travestis e transexuais.
Desde o final da década de 1980 o direito ao uso do nome social vem sendo uma conquista em países do Hemisfério Norte. No Brasil, o primeiro órgão público que regulamentou o direito ao uso do nome social foi a Universidade Federal do Amapá em idos de 2009.
Mas o que é mesmo o nome social? E por que se diz que ele confere dignidade às pessoas?
Nome social é o nome pelo qual somos conhecidos e preferimos ser chamados, e que quase sempre difere do nome que consta de nosso registro civil.
Você sabe quem é Wesley Oliveira da Silva? Não? Mas sabe quem é Wesley Safadão, não é? Sabe quem é Maria das Graças? Ah, esse nome é comum e tem muitas. E Xuxa? Você sabe quem é? Sabe quem é Stefani Joanne? E Lady Gaga, você sabe?
Para essas pessoas o nome pelo qual são identificadas integra o seu patrimônio. São sua riqueza e muitas vezes chega a ser um legado, como é o caso de filhos de pessoas do meio artístico, cultural e político que pretendem prosseguir na mesma carreira de seus pais, e que herdam a força e credibilidade que o nome social carrega.
Até aí, tudo bem, não é mesmo? Então porque ficamos tão incomodados quando o nome social integra o patrimônio de uma pessoa transexual ou travesti?
Você sabe que é Astolfo Pinto? Não? Mas com certeza sabe quem é o travesti Rogéria. Sabe quem é Luiz Roberto Gambini? Mas sabe que é a mulher trans Roberta Close.
Por mais que ainda nos soe estranho, na definição do sexo precisamos levar em consideração não apenas as características anatômicas, mas também os fatores psicológicos, biológicos e culturais que nos identificam. No caso das pessoas trans ou travestis o nome social normalmente leva esses fatores em consideração e por esta razão confere dignidade, respeita a liberdade de escolha e fortalece a luta contra a discriminação.
É importante mencionarmos que até mesmo pelo Sistema Único de Saúde (SUS) já é possível submeter-se, com sucesso, à cirurgia e tratamento médico para ajuste e redesignação sexual.
E se chegamos a esse nível de compreensão e de resposta para os fenômenos de gênero, não há porque nos opor ao uso do nome social para pessoas trans e travestis (salientando que nome social não significa mudança em cartório de nome do registro civil de nascimento).
Imagine alguém cujo nome de registro corresponde apenas à sua genitália, ser anunciado em ambiente sem que este nome em nada remeta ao verdadeiro gênero com o qual se identifica e se apresenta socialmente. Isto pode levar a constrangimentos desnecessários, com exposição da intimidade e da vida privada (que são protegidas pela nossa Constituição), o que nos fere em nossa dignidade. E dignidade é fundamental para o exercício da cidadania e para fruição dos direitos humanos.
Não se trata de aceitar ou não a diversidade de gênero. Ela existe em nossa sociedade, ainda que muitos de nós não se sintam bem com essa realidade.
Respeitar as escolhas e as diferenças das pessoas deveria ser uma característica de nossa humanidade e de nossa necessidade de evolução. Apegar-nos a velhos conceitos que não mais correspondem ao indivíduo de referência de nosso tempo somente alimenta o medo e a violência que em nada contribuem para a vida digna e satisfatória que almejamos e merecemos.
* é advogada, especialistas em Educação em Direitos Humanos, Diversidade, Gestão de Políticas Públicas de Gênero e Raça, Participação Democrática, República e Movimentos Sociais. É Diretora Jurídica e de Diversidade da Associação Brasileira de Recursos Humanos – Seccional Alagoas (ABRHAL) e Superintendente de Direitos Humanos e Igualdade Racial do Estado de Alagoas.
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